segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Baine Casco Sangrento: Como Nossos Pais


Baine Casco Sangrento:
Como Nossos Pais

Steven Nix


Uma carroça caindo aos pedaços seguia pela estrada a caminho do Grande Portão, onde uma pequena patrulha esperava para escoltá-la até a longínqua torre do zepelim. Lá, o carregamento de água seria distribuído aos assentamentos de orcs em Durotar, a terra mais atingida pela recente seca. O jovem kodo puxava a carroça com o ritmo lânguido da rotina coreografada, passando pelo cume da colina antes de sumir.


Um goblin exasperado observava enquanto a carroça desaparecia. A carroça dele devia ter seguido com essa caravana, mas ele estava preso junto ao poço porque a brisa tinha parado, o que tornava inútil a bomba do moinho de vento. — Vamos adiantar isso aí? A gente tem que correr pra não perder a escolta nessa viagem.

— O goblin batia o pé no chão, irritado, enquanto dirigia seu furor contra o jovem orc que lutava com a engrenagem.

— Relaxa, Izwix — disse um guerreiro orc deitado na grama. — O que é que meia dúzia de palermas da Aliança vão fazer? Se mexerem um dedo, levam uma machadada na cabeça. — Ele pegou um galhinho de um arbusto próximo e começou a palitar os dentes.

— A Aliança é uma ameaça, sim, Grotz! — replicou o goblin. — E eu preferia ter uma escolta a depender das suas habilidades medíocres... ou das dele —, disse, apontando para o assassino agachado no mato.

— Não se preocupe comigo, Izwix — disse Dras, aparecendo subitamente do esconderijo. — Quem chegar perto de mim leva uma espetada no meio das costas. Deixe esses cães da Aliança virem.

Izwix suspirou:

— Que é que eu fiz pra acabar com esses dois... hein? — Os arbustos perto do poço chacoalharam. Ele inclinou a cabeça com curiosidade. — O que foi isso?

Todos se viraram na direção do som. Grotz pegou o machado e ficou de pé. O som parou. Ele deu um cauteloso passo à frente, e um farfalhar percorreu toda a extensão da cerca-viva como uma onda. Os arbustos começaram a balançar violentamente. Izwix se afastou com cuidado, aproximando-se do kodo atrelado à carroça de água. Dras sacou as facas nervosamente enquanto o barulho de folhas se intensificava.

Dezenas de feras parecidas com javalis, armadas com lanças e inúmeras outras armas, vestidas em armaduras costuradas, irromperam e investiram contra o grupo. Um ou dois morreram pelo machado de Grotz antes de o subjugarem, e Izwix fugiu. Escapando dos ataques, Dras avançou veloz contra o agressor que vinha à frente. Os javatuscos lançaram golpes a esmo no orc, acabando por atingi-lo na têmpora.

Os outros membros da caravana pereciam um após o outro. O vermelho rapidamente maculou a grama que rodeava o poço. Izwix havia conseguido soltar e montar o kodo, mas uma lança cortou os ares e o derrubou da sela. O kodo continuou manquejando estrada afora enquanto os javatuscos saqueavam a carroça e desapareciam pelo mesmo mato de onde vieram, para os lados da Ravina da Lâmina Espinhenta.

* * * * *

Algum tempo antes disso, Baine Casco Sangrento, grande chefe das tribos taurens, encontrava-se em sua tenda no Penhasco do Trovão com Garrosh Grito Infernal e o Arquidruida Hamuul Runa Totem. Essa reunião não foi acaso: Baine havia decidido não buscar vingança contra Garrosh pela morte de Caerne Casco Sangrento em prol de uma liderança unificada da Horda.
Baine sabia que, para sobreviver, a Horda precisaria de uma figura que tivesse um forte apelo, e Garrosh poderia inspirar o povo dele. Contudo, a reunião não ia bem. Garrosh, antes cauteloso por ter participado na morte do pai de Baine, voltou a se estufar de bazófias e bravatas, levando a Mulgore uma quantidade absurda de exigências.

Vozes ardorosas surgiam e sumiam naquele pequeno espaço. Hamuul, embora normalmente reservado, começava a levantar o tom da voz em resposta à obstinação e à impertinência do jovem orc à sua frente. Aos olhos do tauren, a liderança de Garrosh deixava muito a desejar.

Custava a Hamuul acreditar que Caerne Casco Sangrento, o maior dos líderes taurens, tinha sido derrotado por aquele fedelho. Como conselheiro de Baine, Hamuul abriu as negociações sobre carregamentos de água para Orgrimmar. Até este momento, as conversas não corriam bem.

Baine observava com resignação, mão apoiada sobre a maça, antes de educadamente erguer a mão para intervir. Após alguns instantes, os outros dois silenciaram e olharam para Baine: — Garrosh, você diz que precisa de água, mas e o Rio Furiaustral com seu divisor de águas?

Ele não consegue suprir toda a água de que vocês precisam?

Uma expressão de desdém escapou dos lábios de Garrosh.

— Normalmente, sim, mas está contaminado. Ainda serve para irrigação, mas não é potável e isso é motivo de tensão em nossa cidade e nas áreas há assentamentos de orcs.

Olhando Garrosh nos olhos, Hamuul simplesmente disse: — E o que é que o está contaminando?

Garrosh rangeu os dentes. — Parece que os projetos dos goblins em Azshara têm... efeitos colaterais. A contaminação das escavações se infiltrou no solo e foi levada para o sul pelo rio.

Nós sofremos as consequências.

Os olhos de Baine encontraram os de Hamuul rapidamente. — Por que não ordenar aos goblins que parem? Dar um tempo à terra para se curar e continuar depois? Com prudência e planejamento, eles podem tocar seus projetos de modo restrito sem ferir desnecessariamente a terra.

Garrosh bateu com o punho na mesa:

— Estão loucos? As ações deles são vitais para os preparativos da guerra, e eu não vou minar a segurança da Horda. Mulgore ainda tem água sobrando, e é essa água que suprirá Orgrimmar e os assentamentos externos.

Hamuul disse num tom baixo:

— Eu concordo com Baine, e você sabe que ele está certo. Os goblins precisam parar ou transpor suas obras para outro lugar enquanto a terra se cura e o rio se recupera.

— E por que a opinião de vocês seria mais válida do que as outras milhares que eu ouço todos os dias? — Garrosh apertou um pouco os olhos. — E eu não estou pedindo. Estou mandando.

A discussão se acirrou novamente. Hamuul e Garrosh continuaram berrando até que Baine exasperou-se e gritou:

— Chega! Essas picuinhas não vão resolver nada!

Ambos interromperam o que diziam, surpresos com o arroubo, e fitaram Baine, que disse num tom mais controlado:

— Garrosh, você terá sua água. Mas quero um representante oficial dos taurens como consultor nos futuros projetos dos goblins.

Garrosh fixou os frios olhos em Baine. — Pode apostar que terei minha água. Eu tenho uma obrigação para com a Horda, que é manter todos seguros. Não vou admitir que questionem minha liderança ou meus motivos. — Com isso, irrompeu tenda afora, gritando sem se virar: — Meu emissário virá aqui em breve para agendar os carregamentos!

Hamuul, observando Garrosh ir embora, comentou: — Se ao menos ele desse ouvidos a uma voz que não a dele...

Baine sorriu com tristeza e pousou a volumosa mão no ombro de Hamuul.

— Ele precisa de tempo, Hamuul. Para tipos como Garrosh, o tempo voa. Ele dará vez à razão ou acabará por se enforcar. São os únicos futuros possíveis para ele. Em todo caso, a paciência é nossa maior aliada.

Hamuul meneou a cabeça tentando entender.

— Nós já existíamos antes de virem os orcs, como você deve se lembrar. É verdade que seu pai teve uma dívida com Thrall pelo que ele fez para o nosso povo, mas esta é uma nova Horda.

Ouvi sussurros de outros taurens. Alguns se perguntam se esta Horda realmente é algo de que devemos fazer parte. — bufou. — A Horda fez muito por nós e temos uma dívida com ela, mas você tem de admitir que esses sentimentos não desprovidos de razão.

Baine tirou um mapa da estante e começou a procurar todas as fontes de água de Mulgore.

— Como você mesmo disse, meu pai tinha uma dívida de gratidão com Thrall, mas confiava na Horda que ajudou a delinear. Meu pai se foi, e agora enfrentamos essas mudanças, mas eu ainda acredito na Horda.

* * * * *

Em pouco tempo, tornaram-se comuns as viagens das caravanas de água partindo de vários poços de Mulgore para Orgrimmar. De lá, a água era distribuída, e os cidadãos de Durotar novamente tinham água fresca em seus lares. Um ou outro relatório demonstrava esporadicamente preocupação com tentativas de assaltos, mas no geral não havia grandes problemas na manutenção do suprimento de água.
O primeiro ataque ocorrido em Mulgore chocou Baine. Não só por ter acontecido em suas terras, mas também por ter sido um massacre. A investigação do incidente não revelou pistas ou motivos dos agressores. Nada foi roubado dos corpos, mas a carroça da caravana foi destruída apesar de não ter nada de valor. Afinal, a carroça só servia para carregar um reservatório de água. As manchas de sangue na grama indicavam que alguns corpos foram levados embora, mas se sabia o que tinha ocorrido a todos os outros membros da caravana.

Baine estava perplexo. Primeiro, ele temeu que o ataque fosse uma revanche dos Temível Totem exilados, mas seus batedores Longa Trilha não encontraram provas do envolvimento desse clã.

Um dia, ele estudava esses relatórios quando um mensageiro orc se aproximou e pigarreou.

Baine levantou a vista e fez um gesto para que ele entrasse.

— A que devo essa visita?

— Mensagem do Chefe Guerreiro. — O emissário abriu uma carta e começou a ler “Ao Grande Chefe Baine Casco Sangrento dos taurens, o Chefe Guerreiro da Horda, Garrosh Grito Infernal, manda dizer: Os carregamentos de água continuam dentro do cronograma, o que muito me agrada. Contudo, os últimos vieram contaminados por um agente desconhecido. Espero que isso seja resolvido... e logo.”

Baine pensou um pouco, arqueando a sobrancelha, preocupado.

— Esses carregamentos foram do poço de Casco Invernal. Diga a Garrosh que vou pessoalmente verificar. — Com isso, o mensageiro saiu. Baine deixou um de seus valentes encarregado do Penhasco do Trovão e se preparou para ir ao sul de Mulgore.

* * * * *

Baine observou solenemente os corpos ao redor do poço. A cena era uma carnificina. Três carroças tinham sido irreversivelmente destroçadas, e tudo que não estava fixo foi levado, incluindo os reservatórios cheios de água que elas transportavam. Os kodos haviam desaparecido e oito guardas da caravana jaziam ao redor dos seis trabalhadores que eles tentavam defender. Os guardas estavam mais bem preparados desta vez: pelo menos uma dúzia de cadáveres de javatuscos estavam espalhados pela área.
— São javatuscos, mais bem armados porém. Vê essa armadura? É feita de partes de armaduras da Horda. Nunca vi javatuscos tão bem organizados antes. — Baine ficou pensativo. — Um obstáculo à nossa paz em Mulgore sempre foi a obstinada ameaça dos javatuscos. Meu pai nunca conseguiu estabelecer diálogo com eles. Mas, se eles estiverem sob nova liderança, talvez possamos negociar desta vez.

Baine virou-se para o Longa Trilha mais próximo.

— Avise na Aldeia Narache que eles devem tentar contato com os javatuscos da Ravina da Lâmina Espinhenta. Não podemos pagar massacre com massacre. Não haverá uma guerra crescente na minha terra.

— Vou ficar no meu antigo alojamento da Aldeia Casco Sangrento por alguns dias. Traga notícias assim que puder. — Baine então ordenou ao mensageiro: — Avise a Garrosh que achamos os culpados e que cuidaremos da situação.

Garrosh respondeu poucas horas depois, exatamente como Baine esperava. O Chefe Guerreiro insistiu em mandar tropas para recuperar o território e expulsar os agressores. O fim da mensagem dizia “E se não vencer, pode ter certeza de que eu venço”.

Baine bufou:

— Isso não vai funcionar. Achei que ele perceberia que é preciso evitar outro conflito. Então, que seja. Diga a Garrosh que agradecemos o apoio, mas não há necessidade de operação militar agora. Vamos esperar para ver como saem as negociações. Rezo à Mãe Terra para que sejam frutíferas.

* * * * *

No dia seguinte, o Longa Trilha adentrou a tenda de Baine.
— Tenho notícias sobre a situação dos javatuscos, Grande Chefe.

Baine ficou esperançoso. — Alguma boa notícia, quem sabe?

— Tentamos nos comunicar com eles de todas as formas, mas nossos emissários foram atacados de imediato. A cada tentativa, voltavam cobertos de sangue alheio. — O batedor, vendo a decepção nos olhos de Baine, acrescentou rapidamente: — Mas as baixas foram as menores possíveis. Eles só lutaram o necessário para poder recuar.

Baine suspirou.

— Está bem. Suspendam as tentativas de negociação por enquanto. Preciso descobrir a causa da agressão deles para podermos resolver esse problema sem derramar sangue.

Um dos conselheiros de Baine falou. — Com todo respeito, Grande Chefe, estou certo de que uma pequena força poderia se infiltrar e assassinar o líder. Isso os lançaria em completa desordem e facilitaria a erradicação deles.

— De jeito nenhum. Eu sei que é possível chegar à paz de algum modo. Não vamos ceder aos apelos da ação militar. Esse é o jeito de Garrosh, não o meu.

Ele voltou a atenção para o Longa Trilha que esperava pacientemente. — Vá e leve minha mensagem. E diga também que ninguém deve entrar no território javatusco sem minha permissão. Vou encontrar uma resposta a essa nova ameaça. — O batedor se foi e Baine se preparou para voltar à casa de seu pai.

Baine virou-se para seus conselheiros mais uma vez antes de sair da tenda: — O mundo foi partido, a Aliança perturba nossas fronteiras, e a Horda tenta se devorar nas próprias entranhas. Queria tentar outra solução que não envolvesse sangue derramado.

O mesmo conselheiro tornou a falar:

— Estou inclinado a concordar, mas esses javatuscos são brutos belicosos que vem fustigando nosso povo há anos. Uma paz assim não dura muito.

Baine assentiu discretamente:

— Talvez. A paz pode ser efêmera, mas será que precisamos de outro conflito agora, ainda mais em nossa terra? — Dito isso, seguiu para o Penhasco do Trovão.

* * * * *

Certa noite, não muito depois do último ataque, vários taurens da Aldeia Narache se reuniram em redor do fogo. Os ataques dos javatuscos se intensificaram, e parecia que mais e mais água estava sendo drenada das terras deles e enviada a outros.
O mais velho falou primeiro:

— Não é assim que nossas terras devem ser usadas. Até agora, Baine se rendeu a todas as exigências de Garrosh, aquele fanfarrão, não importa o quão mesquinhas. Até quando vamos ficar sentados enquanto ele entrega tudo que é nosso aos orcs?

Outro tauren, mais jovem, acrescentou:

— Não é possível que sejamos os únicos que pensam assim. Alguém falou com as outras tribos?

O primeiro suspirou.

— Eu falei, mas você sabe o quanto os Fúria de Aço e os Casco de Pedra são teimosos. Não enxergam como as ações de Baine após a morte do pai dele afetaram Mulgore.

— Baine pode não ser como o pai, mas tenho certeza de que ele faz o melhor para nós. Ele nunca colocaria algo acima dos interesses do nosso povo.

— Pode ser, mas isso não faz com que viver aqui seja menos perigoso. Nós, dos Ermo Errante, não somos uma tribo que costuma ficar parada. Por que não partimos? Lembram-se que tempos atrás seguíamos os rebanhos? Temos uma terra só nossa agora, mas ao custo dessa liberdade.

— Ele suspirou e gesticulou para seus companheiros. — Lembram-se? Um novo pedaço de céu a cada mês? Por que temos de ficar acorrentados a uma só terra quando sempre fomos livres?

— E para onde, mais precisamente, deveríamos ir?

O velho tauren deu de ombros e atiçou o fogo.

— Eu não falei que era um plano perfeito...

* * * * *

Baine encarregou seus Longa Trilha de vigiar os movimentos dos javatuscos e seus ultra-agressivos ataques recentes. Os javatuscos sempre foram criaturas beligerantes. Eles estavam apenas intensificando essa hostilidade agora. Apesar da sua robusta rede de batedores, os ataques ainda aconteciam e não apareciam respostas. Havia um tempo que ele não falava com Hamuul. Ele tinha esperança de que o velho arquidruida tivesse achado alguma pista.
Baine encontrou Hamuul examinando a fauna ao pé do Penhasco do Trovão. Sem querer incomodar seu conselheiro, Baine disse em um tom baixo: — Busco seu conselho, Hamuul.

Hamuul levantou-se sorrindo. — Claro, jovem Baine. Ofereço todo auxílio ao meu alcance, como você bem sabe.

— Você está ciente de que falei com meus batedores recentemente sobre a última agressão dos javatuscos. Ainda estão atônitos e não tinham respostas. Sei que você esteve comungando mais com a Mãe Terra nestes dias. Descobriu algo que possa elucidar esse mistério?

Hamuul pegou um punhado de grama, cheirou e deixou que o vento o carregasse. Observou os pedaços caírem e meneou a cabeça. — Ainda não, infelizmente. A comunhão com a terra demora, Baine, especialmente com essas tribulações. Continuarei minhas meditações. Não faria mal consultar um ou dois xamãs também...

* * * * *

Baine sacudiu sua cabeça anuviada enquanto olhava Hamuul partir murmurando. Foram muitos acontecimentos na ausência de seu pai. Ele não sabia como resolveria isso, mas estava determinado a descobrir um jeito. Houve muitas disputas nos últimos anos. Uma solução pacífica para esse problema seria uma lufada de ar fresco.

Subindo de volta, Baine encontrou um grupo de taurens com bolsas e suprimentos. — Olá! Os Ermo Errante estão partindo numa jornada?

Eles curvaram a cabeça simultaneamente, e o líder do grupo falou: — Lamentamos muito, Grande Chefe, mas não podemos mais ficar em Mulgore.

Baine fechou os olhos por um instante. Quando os abriu, o que restava de seu bom humor havia sumido. — Eu os encorajaria a ficar, Casco Cinzento. Eu estaria mentindo se dissesse que não são tempos difíceis, mas é agora, mais do que nunca, que precisamos ficar unidos.

O velho tauren assentiu.

— Você fala a verdade, mas não há muito que possamos fazer. Lembra-se dos tempos idos?

Ainda há terras que não provaram o gosto da guerra. A vida pode ser pacífica e livre se formos nômades de novo.

— Mas os velhos costumes não mais valem como antes. Ser nômade é para um mundo muito maior que este mundo, que foi reduzido pela guerra e pela expansão. Fixados em uma terra, temos um lar, e é através de nossa união como povo que poderemos protegê-lo da forma que merece.

Casco Cinzento agitou-se, constrangido.

— Infelizmente, como tantas outras terras, Mulgore agora é só um prolongamento da vontade de Garrosh. Só queremos um lugar que a arrogância dele não alcance. Agradecemos por carregar o manto de líder após a morte de seu pai, mas essas mudanças foram demais para nós.

Pondo a mão no queixo, Baine disse sem rodeios: — Garrosh é o líder da Horda; arrogante ou não, nós juramos lealdade a essa mesma Horda, que é mais do que seus líderes. É um conceito perene e unificado que meu pai e Thrall ajudaram a delinear. Se tiver chance, esses problemas serão superados e a Horda vencerá tanto de seus inimigos quanto das disputas internas. Isso eu posso prometer.

— Se você diz, Grande Chefe. — Baine acenou abruptamente e seguiu de volta para o Penhasco do Trovão. Casco Cinzento disse ao grupo: — Vamos voltar à Aldeia Narache e nos preparar para a viagem. Vai levar um tempo até que estejamos prontos para partir.

* * * * *

Dias depois, Hamuul voltou a Baine com um orc grande e imponente. O orc curvou-se longamente e disse:
— Eu sou Swart, do Monte Navalha, Grande Chefe. Fico muito honrado de finalmente conhecê-lo.

Baine respondeu ao cumprimento e disse:

— Também fico honrado. Hamuul me falou de você, e qualquer amigo dele é muito bem-vindo ao Penhasco do Trovão. A que devo esta visita?

Hamuul tomou a palavra:

— Trazemos boas novas. Você queria um fim pacífico para nosso conflito com os javatuscos.

Não foi fácil, mas achamos que temos uma solução.

Baine sorriu.

— Ah, que notícia maravilhosa. Meu pai sempre estava assoberbado com outros assuntos para dedicar atenção aos javatuscos, embora suspeitasse que poderia negociar com eles. Por favor, prossiga.

Hamuul continuou:

— Ficamos todo esse tempo em profunda meditação e acreditamos que finalmente descobrimos a fonte da inquietação. Swart?

Swart pigarreou:

— Entre os javatuscos, há indivíduos chamados Busca-águas, especialistas em achar água que, devido à atual perturbação da terra, parecem ter perdido o jeito. Desesperados por água, eles estão avançando mais agressivamente no terreno, mas recuam à segurança de suas matas à noite. Para nós, a solução é simples: encontrar para eles uma fonte local de água. De algum modo. — disse, olhando para Hamuul.

Hamuul sorriu:

— E é aí que eu entro...

* * * * *

Baine e Hamuul esperavam na antecâmara de Garrosh, chicoteando a cauda com irritação.
Garrosh não se apressava para ninguém, nem mesmo líderes. Quando ele chegou, Baine foi direto ao ponto, algo que raramente fazia. — Chefe Guerreiro, temos informações cruciais para o futuro dos carregamentos de água. Achamos que é necessário discuti-las com você.

— Os ataques se tornaram mais audaciosos nas últimas semanas, mas acreditamos ter encontrado a fonte do problema e da contaminação nos carregamentos de água. Os javatuscos são uma ameaça que assombra nosso povo por anos, mas nunca quiseram mais do que expandir o território, algo que podem fazer facilmente no subsolo. Parece que agora, com a terra atormentada, eles precisam de água também.

Um jovem emissário tauren entrou correndo na câmara, interrompendo Baine. — Grande Chefe!

Minhas desculpas, mas fui enviado para informar que outro ataque foi descoberto. Os integrantes da caravana foram mortos; a água e o equipamento foram roubados!

Baine assentiu.

— Obrigado pelo relatório. Volte ao Penhasco do Trovão e informe a Ruk Pisa Guerra que chegarei em breve para cuidar da situação.

Assim que o mensageiro saiu, Garrosh começou a andar pela sala.

— Este é o terceiro incidente só na semana passada. Sabemos quem são os responsáveis, mas nenhuma punição foi aplicada, e esses javatuscos ainda debocham de vocês atacando as fronteiras. Minha confiança está se esgotando.

Baine ergueu a mão. — Garrosh, o que você não entende é que isso é assunto do território dos taurens e, como tal, será resolvido por nosso povo. Eu vou cuidar disso. Neste exato momento, estamos buscando orientação da Mãe Terra.

Agitando os braços aleatoriamente, Garrosh gritou: — Mãe Terra! Mãe Terra! Só ouço o tempo todo essa mesma ladainha. O que é essa tal Mãe Terra afinal?

— É a criadora do nosso povo e a voz da sabedoria da terra que nos orienta...

— Vocês estão usando a Mãe Terra como muleta. — interpelou Garrosh. — Só enrolam e debatem, mas não tomam nenhuma atitude! Esses javatuscos querem é uma demonstração de força, e é isso que a Horda vai dar...

Baine tomou fôlego e continuou calmamente:

— Garrosh, peço gentilmente que você respeite nossos costumes e métodos. Esse problema será resolvido em breve, sem derramamento de sangue. Há mais em jogo do que parece. Esses ataques cheiram a desespero. Uma solução para o problema deles resolverá o nosso também.

Enquanto Garrosh o fitava, Baine concluiu:

— Entendo seu desejo de expulsá-los, mas os javatuscos são mais determinados do que você imagina. Um ataque direto terá consequências, e meu povo sofrerá com elas.

— Na hora que eles atacaram nossa fonte de água fresca, virou problema da Horda. Todos sofremos juntos, e sua demora nos causa prejuízo dia a dia. Não vou ficar parado enquanto vocês deixam que a força e a vontade da Horda seja motivo de deboche. Essa agressão terá resposta... e logo. — Com isso, Garrosh marchou para fora da sala e sumiu de vista.

Hamuul observou a saída de Garrosh e bufou:

— Nem sequer escuta. Típico. E o que ele acha que pode fazer a respeito disso?

Baine ergueu Britamedo. A cabeça prateada da maça, com seus aros de ouro e suas runas, tinha um brilho ofuscante. Ele acenou com a cabeça e partiu para o zepelim que esperava: — Temo que Garrosh possa estar subestimando o inimigo que vai enfrentar. Quando voltarmos ao Penhasco do Trovão, convoque os Andarilhos do Sol. Ele pode precisar de nossa ajuda, quer queira, quer não.

* * * * *

Naquela noite, enquanto o Penhasco do Trovão dormia, Baine andava pela sua tenda. Sua insistência em achar uma solução pacífica levou a mais caravanas atacadas e a um ataque em larga escala à sua terra que poderia ter arriscado a vida do Chefe Guerreiro. Quando Hamuul entrou, Baine parou sua reflexão e disse com pesar: — Não tenho mais certeza de que este seja o curso certo. Talvez os Ermo Errante estejam corretos. A Horda não era assim quando meu pai era o grande chefe. — Fez uma pausa. — Antes minha dúvida era se eu conseguiria liderar nosso povo. Agora me pergunto se devo liderá-lo.
Hamuul respondeu com um discreto trovejar na voz: — Não é hora para duvidar de si, jovem Baine. Você está indo tão bem quanto seu pai. Estou certo de que a sabedoria que você demonstra e a paixão que você coloca nisto para que dê certo teriam a aprovação dele. — Ele fez um gesto largo com mão, dizendo: — E aqueles que não veem isso devem mesmo ir embora e tomar outro rumo.

— Lembro que, pouco tempo atrás, você tinha a mesma opinião que eles. — disse Baine, sorrindo com o canto da boca.

O tom de Hamuul ficou nitidamente mais sério:

— Falei sem refletir, por frustração. Sou o primeiro a dizer que errei. Vamos resolver isso, e você verá que é um líder. Mesmo que ainda não saiba.

* * * * *

Enquanto isso, Garrosh preparava os Kor'kron para invadir a Ravina da Lâmina Espinhenta.
Havia quinze de pé à sua frente, todos com olhos vacilantes, mas cintilando com uma maliciosa empolgação pela batalha iminente.

— Esses taurens levam até um kodo na conversa, mas não tomam uma atitude quando a própria terra está sendo invadida! — bradou Garrosh. — Vamos mostrar a eles o que guerreiros de verdade fazem. O alvo são os covis dos javatuscos ao sul de Mulgore. O ataque começa antes do sol raiar. Estejam prontos!

Os guerreiros o saudaram e foram se preparar. Garrosh voltou a sentar no trono com Uivo Sangrento no colo. Ele os levaria à vitória, e o machado de seu pai voltaria a entoar o canto de glória na batalha. Os dentes de Garrosh surgiram sob um sorriso de satisfação.

* * * * *

Os Kor'kron eram uma elite: eram letais e contavam com a vantagem da surpresa. Os escuros zepelins cortaram os ares em silêncio nas primeiras horas da madrugada, parando perto da área dos javatuscos. Com Garrosh à frente, os guerreiros desceram por cordas, caindo praticamente na cabeça dos javatuscos. Lâminas faiscaram num turbilhão de ataques. Dez javatuscos quedaram mortos, deixando escapar apenas um guincho, que atraiu os que guardavam a entrada da toca. Esses também, atônitos, pereceram sob a enxurrada de machados e espadas. À medida que os zepelins se afastavam para uma posição mais segura, os Kor'kron avançavam pelos túneis despachando rápida e eficientemente qualquer resistência que encontravam.
A batalha foi curta, mas intensa. Os javatuscos defenderam sua terra natal com uma ferocidade que surpreendeu até a Garrosh. Acostumados à luta em túneis apertados, eles usavam até as presas se preciso e atacavam com ardor insensato. Eles não tinham medo de morrer lutando pela sua terra. Garrosh ria para si mesmo enquanto os javatuscos caíam aos seus pés. Hoje ele os ensinaria a ter medo.

Minutos depois, o grupo chegou à câmara principal. Garrosh sempre à frente, triunfante e com Uivo Sangrento erguido, pronto para desferir um golpe. Acenou com a cabeça, orgulhoso: o chão estava coberto de corpos, e o único som era a respiração arquejante dos guerreiros. Eles fuçaram aqui e acolá procurando pistas e decidindo por qual dos inúmeros túneis seguir. Em instantes, ouvindo ruídos atrás, viraram lentamente na expectativa de acabar com os poucos sobreviventes.

Mas não eram uns poucos. Os túneis vomitavam um número incontável de feras. Os recém-chegados pararam por um momento ante a visão do chão coberto por dezenas de corpos de sua estirpe. Garrosh vociferou:

— Hoje vocês pagarão. Hoje vocês testemunharão a ira da Horda!

Ao sinal de Garrosh, os Kor'kron lançaram uma chuva de machados contra a aglomeração, arrancando grunhidos que ecoaram pela caverna. Mas os javatuscos ainda não atacaram. Outra saraivada de machados caiu sobre eles, mas ainda assim nenhum avançou.

— O que é isso!? — berrou Garrosh. — Renderam-se assim tão fácil? Não terei misericórdia para com vocês. Serão destroçados aí mesmo onde estão!

A multidão aglomerada à frente dele levantou as armas num gesto único e grunhiu alto em uníssono. Enquanto se viravam para todos os lados, os Kor'kron viram a caverna ser inundada por centenas de feras que apareciam subitamente dos túneis no chão e dos buracos no teto.

— Corram para o flanco esquerdo! Avancem! — gritou Garrosh. — Não deixem que eles fechem nossa saída para a superfície! — Os guerreiros caíram sobre os javatuscos, mantendo a saída às suas costas. Quase não se via o Uivo Sangrento enquanto golpeava velozmente os agressores. Eles morriam, soltando grunhidos agudos, mas vinham outras feras para substituir os mortos.

— Avante! — ecoou o brado de comando, e os guerreiros avançaram com ainda mais força contra os grunhidos ensurdecedores dos javatuscos, que por sua vez os repeliam sem hesitar.

Lampejos de cores iluminaram o rosto contorcido dos Kor'kron enquanto os xamãs lançavam feitiços sobre eles. Rugidos trovejavam e ecoavam pela caverna toda vez que eles eram atingidos. Garrosh percebeu, com certa desesperança, que cada lampejo revelava que seu grupo de guerreiros estava cada vez menor. Derrotados, eles deixaram cair suas tochas, que rapidamente foram apagadas. Garrosh rugiu e lutou com ainda mais fúria e vigor renovados. Ele era o Grito Infernal e não seria vencido por feras patéticas. Ele ia tirá-los dessa situação.

Ele brandiu Uivo Sangrento cada vez mais rápido, até que o ar se encheu com o som exótico do movimento do machado. O uivo reverberou pelos túneis e teve como resposta os guinchos de mais feras. Enquanto Garrosh avançava, javatuscos voavam para todos os lados ou eram retalhados pelo machado, mas havia um número infinito deles. Não davam trégua, não recuavam. Garrosh entrou mais fundo na caverna até que nem mesmo a luz da superfície podia alcançá-lo. Ele estava só, cercado pela escuridão e por uma onda sem fim de javatuscos que guinchavam horrendamente. Eles começaram a arrancar a armadura dele, arranhando e mordendo a carne exposta, empurrando-o ainda mais para dentro do túnel.

Não havia mais nada a fazer: a única possibilidade era ir na direção para onde empurravam, mais para o fundo. Ele sentia o hálito quente e ouvia os grunhidos de empolgação. Ele começou a voltar, tateando em busca do caminho à superfície, mas encontrou apenas um túnel curto que terminava abruptamente. Uivo Sangrento ficou preso numa fresta lateral, e ele ficou de costas para o fundo do túnel.

Com um rugido grave, Garrosh se lançou sobre a maré de pelos e espadas. Ele desviou a lança de um atacante para enterrá-la na cabeça de outro. Ao fazer isso, a tocha que o bicho estava segurando, última fonte de luz, caiu e se apagou. Tudo ficou escuro. Mais e mais vieram e, embora estivesse sozinho, perdido na escuridão, Garrosh só pararia quando estivessem todos mortos. Seus braços começaram a doer e sua respiração ficou entrecortada, mas ainda assim ele avançava, usando qualquer arma que caísse em suas mãos. Para cada fera que caía morta, outra rapidamente ocupava seu lugar.

Lentamente, ele começou a ser subjugado e cada vez mais ataques dos javatuscos o atingiam.

Ele conseguia ver uma luz muito tênue que permeava a escuridão, mas estava mais preocupado com o combate. A luz foi ficando mais brilhante, e muitos agressores pararam. Ele ouviu um tumulto bem longe no túnel principal. De repente, uma luz impossivelmente brilhante estava inundando tudo com seus raios, e a fonte da luz estava se aproximando. Os javatuscos em redor dele gritaram de ódio e fugiram para o lugar de onde vieram. Mesmo ofuscado, Garrosh conseguia ver as feras voando para os lados como se não passassem de bonecos de papel.

A luz ficou ainda mais brilhante e chegou perto da curva onde ele estava se defendendo. Logo ele viu Baine ladeado por Hamuul Runa Totem e mais um grupo de Andarilhos do Sol. Baine gritou para dentro do túnel:

— Aguentem firme, irmãos! Não temam a escuridão! — enquanto Britamedo brilhava em sua mão, mais luminosa do que a luz que emanava dos próprios Andarilhos do Sol. Enquanto as feras caíam uma apos a outra ante a maça enânica, Baine se perguntou por um momento se Anduin Wrynn aprovaria que seu presente fosse usado desse modo. Até que, em massa, os javatuscos recuaram mais para dentro da toca escura e protegida.

Baine correu para o Chefe Guerreiro. — Garrosh, pegue sua arma e vamos. Temos que sair daqui antes que eles deem a volta e nos cerquem. — disse, colocando Garrosh de pé e o ajudando a tirar a arma que estava presa na parede do túnel. — Depressa!

Rapidamente, eles partiram na direção da superfície. A não ser pelos corpos espalhados no chão, não havia obstáculos no caminho. Baine estava contando com a sorte e esperava que tivessem espantado completamente os javatuscos quando passaram por uma caverna relativamente grande. Chegando do outro lado, Hamuul pediu para parar. Ele ajoelhou-se e começou a balbuciar, buscando o caminho correto da saída. Na hora que ele se levantou e andou para a saída, as paredes eclodiram. O grupo se virou, pronto para enfrentar um novo ataque, mas parou subitamente ao ver os atacantes.

Garrosh gritou mais alto que o alarido:

— O que é aquilo?

Baine deu um cauteloso passo para trás.

— Quem me dera saber, Chefe Guerreiro...

Javatuscos bem maiores que o normal e extraordinariamente pálidos começaram a cercar os combatentes ali reunidos. Quando se moviam, emitiam sons tão bizarramente agudos com a boca que feriam o ouvido. O corpo deles era branco acinzentado e tinha cerdas espinhosas de um verde-escuro grotesco, além dos grandes olhos protuberantes. Eles eram bem mais altos que qualquer outro javatusco que os taurens (ou qualquer outra raça) já tinham visto, e a malícia esperta nos olhos deles indicava que eram bem mais hábeis do que seus semelhantes, que haviam sido massacrados por Baine, Hamuul e os Andarilhos do Sol.

Baine pediu a seus Andarilhos do Sol que ficassem parados. Os dois lados se encaravam. O único caminho era ir para trás. O ar foi ficando pesado e exalava um odor asqueroso de terra à medida que as feras preenchiam cada espaço da caverna. Mas não houve ataque. Era como se eles estivessem avaliando os invasores, planejando qual seria o próximo passo.

Garrosh brandiu seu machado e gritou:

— Feras fantasmagóricas! Vamos acabar com isso agora!

Baine gritou para Garrosh:

— Chefe Guerreiro, precisamos chegar a céu aberto! Estaremos perdidos se ficarmos aqui! — Com um gesto de Hamuul, pequenas vinhas brotaram do chão, perfazendo um caminho pelo labirinto de túneis até a saída. — Sigam depressa! — ordenou Baine.

Arrastando Garrosh, que rugia, Baine, Hamuul e os Andarilhos correram para a superfície, chegando à saída logo que o feitiço de Hamuul acabou. Agora eles tinham margem para manobra. Enquanto Garrosh cuidava da saída do túnel, Baine pegou o sinalizador goblínico do cinto de Garrosh e o disparou para cima. Os zepelins começaram a vir para o local, mas não foram rápidos o suficiente. As feras abomináveis chegaram à superfície, protegendo os olhos da luz matinal.

Baine avançou para elas logo que saíram, e elas estacaram, cientes de que estavam fora de seu elemento. Ele virou-se para Hamuul quando o arquidruida fez um gesto e gritou para a multidão à sua frente:

— Há uma solução melhor, que todos vocês ignoraram. Contemplem as bênçãos da Mãe Terra!

— Dizendo isso, Hamuul deu um passo à frente e, com um grito, cravou seu cajado no chão.

Irromperam muitas águas de uma copiosa fonte à sua frente, que envolveram quase todos os javatuscos albinos e avançaram como um trovão, varrendo-os de volta para o túnel. Aqueles que ficaram foram derrubados pela explosão, junto com um humilhado Garrosh. Os taurens continuaram firmes e imóveis, ancorados à terra que tanto reverenciam.

Um novo rio correu a partir do ponto onde Hamuul colocou seu cajado, trilhando sobre as pedras e entrando no túnel para as profundezas da terra. Quando os javatuscos levantaram-se novamente, Baine deu outro passo na direção deles. — A terra é generosa para com todos aqueles que a respeitam. Agora há água para todos. Vocês verão que esse rio achou seu rumo, passando pelos túneis, até um lago subterrâneo. Aceitem essa dádiva e não nos perturbem mais.

Os javatuscos lentamente voltaram ao túnel enquanto a luz tocava as colinas que cercam Mulgore. A aurora era muito importante para os taurens, já que simboliza o renascimento, mas hoje aumentou ainda mais respeito deles pela Mãe Terra e suas dádivas. Eles passaram pelos corpos dos javatuscos que pereceram no primeiro ataque e seguiram para a Aldeia Narache.

Garrosh caminhava em silêncio, furioso demais para falar. Observando os movimentos rígidos de Garrosh, Baine percebeu que essa reação não o surpreendia.

O primeiro zepelim finalmente chegou ao local e lançou uma escada de cordas até o chão. Baine olhou para a aeronave e depois para os Andarilhos do Sol que estavam ali. Seu olhar caiu sobre Garrosh por alguns momentos antes de ele acenar para a aeronave e dizer: — Vá liderar a Horda. Se precisarmos de sua ajuda em Mulgore de novo, nós avisaremos. — Com isso, virou as costas para o Chefe Guerreiro, que continuou calado, e pegou o caminho de volta ao Penhasco do Trovão, com os Andarilhos em seu encalço.

* * * * *

A noite começou a cair em Mulgore, lançando longas sombras na terra. Fogueiras pontilharam platôs e planícies à medida que os taurens se acomodavam. Hoje eles dormiriam tranquilos, sabendo que sua terra estava segura novamente. À porta da tenda de Baine, Casco Cinzento e mais alguns dos Ermo Errante hesitavam. Por fim, ele disse: — Fortaleçam seu espírito. Temos que fazer isso.
Seguido dos membros de sua tribo, ele entrou na sala principal, onde Baine tentava descansar e perguntou em tom baixo:

— Grande Chefe, podemos tomar um minuto de seu tempo?

Baine se levantou com um sorriso cansado.

— Certamente. O que posso fazer por vocês?

O tauren ancião baixou a cabeça e disse:

— A despeito de suas palavras, nosso coração ainda estava aflito. Preparamo-nos para a jornada e, nas primeiras horas da manhã, partimos. Testemunhamos seu triunfo sobre os javatuscos, foi realmente inspirador. Você tem a força de um líder e confia em uma sabedoria que fomos cegos demais para ver. Temos vergonha de admitir que quisemos deixar esta terra e humildemente pedimos seu perdão, Grande Chefe.

Baine fez um gesto com a mão, demonstrando ter compreendido.

— Vivemos em tempos incertos e turbulentos. É fácil perdoar seus corações aflitos. Esses javatuscos não mais irão nos incomodar em Mulgore, mas isso não significa que não temos problemas. Estamos sendo ameaçados por problemas internos e externos, mas somente juntos poderemos superá-los.

Baine foi à entrada da tenda e ficou olhando para fora um bom tempo. Via o Penhasco do Trovão se preparando para a noite, com suas fogueiras esparsas ao longe. Dava para ver a silhueta pouco distinta da Aldeia Narache, onde jovens e valentes taurens terminavam seu treinamento.

Logo eles seriam necessários para as provações por vir, provações que testariam ainda mais a fé e o estoicismo de seu povo.

Baine assentiu com a cabeça e voltou sua atenção para o pequeno grupo à sua frente: — Nosso povo andou nestas terras por muitos e muitos anos e aprendeu muito sobre o mundo nesse tempo. Nossos aliados nos procurarão buscando sabedoria e orientação. Certa vez, meu pai fez uma promessa à Horda para pagar uma dívida que lhe devíamos por seus serviços à nossa raça. Eu, pelo menos, pretendo cumprir essa promessa.

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